Time Traveller

     

domingo, junho 29, 2003

 
Totem:

Este post saiu de uma conversa que tive com o Wilton, "Que morra comigo o mistério que está escrito nos tigres.". Gosto das causas e efeitos Wil mas será tão simples assim? O Wil não é um cara místico, eu também não, embora acho que busquemos experiências extras-qualquer coisa, cada um a sua forma.
Não é de hoje a crença de que cada um de nós está ligado a um animal. Para parte dos índios norte-americanos este totem animal é hereditário, para outras tribos cada indivíduo constrói um laço com um "espírito" animal diferente. Não importa de onde venha, esta representação homem/animal é certamente mais vasta e antiga do que posso imaginar; deuses egípcios, xamanismo, lendas, totens, pets... Talvez de fato carreguemos um animal dentro de nós, resquícios de nosso passado primitivo, nosso lado instintivo ou mesmo talvez nosso alter ego.
A tempos que eu queria escrever sobre algo assim. Os animais que colocarei aqui no site de agora em diante são leituras minha, nada de mistico ou científico. Aguardem os próximos conforme for surgindo oportunidade.

E Wil, o mistério dos tigres é alcançável dentro de cada um de nós, mas seria possível eu faze-lo entender? É por isso Borges diz "Por isto não pronuncio a fórmula, por isso deixo que os dias me esqueçam, deitado na escuridão." ou é por que ele descobre ser muito pequeno? Ou seria os dois?


Eu sempre nutri uma certa simpatia pelos equinos, mas depois da faculdade acho que passei a venera-los. Se algum animal habita em mim, é meu alter ego ou seja lá o que for, deve ser este.



Os cavalos:
Olhando para eles, grandes, rápidos, musculosos até esquecemos que ele não é um predador e sim uma presa. Por isso os equinos são curiosos e desconfiados, exímios conhecedores de caráter. Não que todos sejam ótimos camaradas, mas todos vão querer ter certeza de com quem estão lidando. E é preciso saber que um cavalo nunca esquece.
Quem olha aquele bicho enorme e majestoso no pasto não imagina que o cavalo é um bicho frágil que vive sobre estresse constante. Cada parte do seu corpo é uma extensão do mundo. Ele responde com os olhos, olha com os ouvidos e escuta com toda a sua pele, ele está eternamente pronto para se mandar dali porque é da suas habilidades de observar e correr que depende sua vida.
O instinto dos equinos tambem é forte o suficiente para eles saberem que a vida em bando é essencial para sobrevivência. Estabelecem laços e hierarquias entre eles, e o fazem conosco. Um cavalo pode ocupar uma posição mais baixa entre alguns animais mas ser líder entre outros. Nós temos que decidir se seremos o seu líder ou se deixamos que ele nos lidere, mas liderança consiste em confiança. Em quem vamos confiar? Tornar parte de nossa família? Quando você monta põe sua vida nas mãos do animal e o animal põe a dele nas suas mãos.



quinta-feira, junho 26, 2003

 
...ainda sobre correspondências:

Já que eu falei em correspondência... acho que com um pouco de esforço um e-mail pode ter um certo charme, não vou ser injusta, apesar de nada mais descartável e impessoal. Eu bem que me esforço, mas um e-mail destes sem resposta é ainda mais triste que uma carta sem resposta simplesmente pelo fato de a coisa ser tão fácil... ou será que não é?
Só de raiva (e falta de tempo) vou postar um e-mail pessoal que enviei para uma pessoa e não tive resposta. (Será assim tão fácil responder?)

---E-mail da Giu para alguem---

"Quantas linhas ou quantas paginas tem a história perfeita? De entendimento perfeito? Acho que essa história não teria graça. O que aprendemos* guardamos por toda vida, o que nos ensinam**, nem sempre faz sentido. De qualquer forma ainda aguardo por ela, mas que seja construída por força semelhante a insensatez porem que apenas requeira um pequeno dispêndio de energia por parte do leitor.
Infelizmente hoje ninguém mais tem disposição pra isso não?
Fernando Sabino e Clarice Lispector trocaram cartas por quase 20 anos***. Fica fácil falar assim, não? Dois matutos conversando. Tem momentos que gostaria de entrar no meio da conversa porque acho que mais ninguém ia entender alem deles. Não é verdade, tem gente que entende, mas você não esta entendendo nada não?
Então vou escrever um pedaço do livro pra você:

Carta do Fernando p/ Clarice 1946
'O que você deve ter não é um problema, mas muitos problemas, que podem ser horríveis, mas são muitos, portanto não são você, apenas te prendem (...) Creio muito em você, tanto quanto às vezes creio em mim
mesmo. De repente descreio violentamente: tenho medo de falharmos.'


Será que um deles encontrou?
Bom, ele sabe como somos incrivelmente pequenos, não? E nós, sabemos?
Beijos
Giu

Obs:
*Palavra derivada de "apreender": apropriar-se (Dic. Aurélio)
**Transmitir conhecimento (Dic. Aurélio)
***Publicadas"



terça-feira, junho 24, 2003

 
Correspondência:

Estou emocionada, sempre fico emocionada nestas ocasiões, hoje recebi uma carta. E não era conta para pagar, não era propaganda de pizzaria, nem multa. Era um envelope branco endereçado a mim, com meu nome escrito a caneta, selo, estampa e tudo mais. Não precisei ler o remetente porque reconheci a letra e também provavelmente porque a Novs é a única pessoa que eu conheço que ainda escreve cartas. Entrei em casa com o papel estalando na mão, coloquei-a no escritório, tomei banho, preparei um lanche e só então sentei para ler, rasguei com cuidado o canto do envelope e desdobrei três folhas escritas a mão, li as novidades, não tão novas, satisfeita por segura-las em minhas mãos. Tive que seguir todo um ritual para fazer jus a carta. Não que não nos falemos por e-mail ou telefonemas esporádicos, mas uma carta é uma carta, um artesanato. A carta trás nas linhas o humor do autor, as condições no papel, percorre um longo caminho, pode ser lida, relida, queimada, amassada, guardada de baixo do travesseiro, ser, muitos anos depois, encontrada.
Em quartos escuros, iluminados apenas pela mingua luz de velas, olhos atentos as palavras, talvez letras desenhadas cuidadosamente a bico de pena... durante séculos cartas de negócios, de saudades, de amor, de mágoa, atravessavam o mundo para fazer história, mesmo numa época em que uma carta levaria seis meses para ir da Inglaterra a China, elas carregavam o coração dos homens, que aguardavam ansiosos a chegada a seus destinos e mais ansiosos ainda esperavam por respostas.
Ter amigos distantes não garante cartas. Não me faltam pessoas que amo mundo afora, seja Inglaterra ou Campinas, seja Missouri ou Tatuapé; numa era onde o mundo parece tão pequeno a tecnologia apenas ampliou o espaço entre nós.
Tenho uma dívida a pagar, e que pagarei com o maior prazer, se não pude ir até Concórdia é uma parte de mim que vai.



segunda-feira, junho 23, 2003

 
Constatações pós-feriado

To começando a desconfiar que eu odeio feriado.
Quando era jovem (dramático, né?) eu não fazia planos nenhum pro feriado ou mesmo férias e passava o dia inteiro batendo pernas por ai. Agora, já uma pessoa mais atarefada na vida, o feriado é uma oportunidade de colocar o trabalho, a cultura e o social em dia. Estranho é que, apesar de tantos planos, não lembro de ter feito coisa alguma neste feriado. O problema de quando ficamos velhos não é falta de tempo, mas sim uma falta de paixões ao estabelecer prioridades.
Outro probleminha que descobri, é difícil ser a única redatora de uma "publicação" que se propõe a ser original e, se não diária, ao menos "biária" (aquilo que acontece a cada dois dias????). Hoje tá difícil, então vou ter que citar Borges (e esse é ele de verdade e não aquelas falsificações mal feitas que rolam por ai na net)
"Fui feito de uma matéria desagregável, de misterioso tempo
Talvez o manancial esteja em mim
Talvez de minha sombra surjam fatais e ilusórios dias"

PS:
O Feriado também foi tranquilo no blog mas é bom ver que ele não está atraindo somente os taradões do google, também entraram aqui procurando por "eu odeio franco da rocha", "treinos de boxe", "dietas de proteínas" e até mesmo um australiano procurando por um viajante do tempo!


terça-feira, junho 17, 2003

 
A nossa loucura de cada dia:
(parte 4)

A pior coisa de freqüentar academia é que antes você só achava que tinha que perder uns quilinho e depois começa a ficar incomodado com aquela dobrinha milimétrica na barriga que só você vê, com a proporção de gordura no seu corpo, que sempre será alta não importa quanto baixa ela estiver e outros detalhes que viram um problemão.
Quase todo mundo que eu conheço da academia já tentou alguma solução mágica para problemas que, muitas vezes, são imaginários: dolorosas aplicações de lipostabil para afinar a cinturinha, doses cavalares de estimulantes para agüentar treinos extensos, suplementos de aminoácidos para crescer, chá para emagrecer, dieta de proteína para rasgar, dieta de carbo para render, dieta de água para sumir.
Categoria nova, depois dos alcaholics e workaholic, surgem os bodyaholics, cujo o sonho de consumo é uma lipoaspiração, a ultima refeição no corredor da morte seria um shake de mioplex, o feriado mais odiado é a páscoa e tem como lema de vida "só preciso perder mais dois quilos". Os bodyaholics ficam felizes com elogios mesmo achando que ainda possuem um longo caminho pela frente, o objetivo não é mais saúde nem prazer pelo esporte, é estético, e se paga o preço alto, não na forma de lesões, de péssima alimentação ou social, mas sim numa eterna frustração narcisista na busca por um objetivo inalcançável, não porque têm como parâmetros modelos estéticos irreais mas simplesmente porque não conseguem enxergar o próprio corpo, ou talvez nem mesmo se sintam confortável dentro dele.
Duro conviver no meio e não se tornar um bodyaholic, eu cheguei até mesmo a estar quatro quilos abaixo do meu peso saudável, hoje gosto dos meus dois quilos a mais, eles me aquecem no inverno.



domingo, junho 15, 2003

 
A nossa loucura de cada dia:
(parte 3)

Hipocondríacos... Minha irmã já sofreu de todas as dores possíveis, lembro do meu pai, quando ainda morávamos juntos, com frasquinho de baralgim espalhados pela casa, minha vó de 86 anos, a mais de 4 décadas atrás, chegou a pedir extrema-unsão duas vezes e contava a seus filhos historinhas de horror sobre suas possíveis mortes, meu sobrinho de 3 anos é louco por "dodóis" e diz que precisa ir no médico a toda hora. Como sobreviver a essa maldição???
Deprimi, tive gastrite, me recuperei, virei atleta, tive lesão no joelho de tanto pedalar, melhorou, tive lesão no ombro de treinar boxe, voltei pra bike, lesão no tornozelo em tratamento, miopia aumentando, óculos novos, suspeita de ceratocone, "será que estou ficando cega?", de castigo sem poder usar lentes, dores de cabeça fortíssimas, "será um tumor?", to cansada, "é, deve ser tumor".
Será que sou hipocondríaca? Não perco um episódio de ER...
Ou serei eu um imã de doenças psicossomáticas? Dramática...
Que atire a primeira pedra aquele que nunca achou que ia morrer quando passou mal por causa daquela azeitona da empadinha ou sentiu todos os sintomas quando viu aquele programa especial sobre cancêr vesicular...
Quanto a mim, até que sou normal se levar em conta minha genealogia.


quinta-feira, junho 12, 2003

 
Para o dia dos namorados
e todos os outros...

Ontem assisti um programa na GNT chamado "A guerra dos sexos". O programa mostrava várias experiências científicas que analisavam as diferenças entre os sexos. Por exemplo, garotas, se quiserem achar um cara que seja macho, banhado em testosterona, um excelente reprodutor, procurem um homem com o dedo anelar consideravelmente mais longo que o indicador, isso indica que ele recebeu altas doses de testosterona antes de nascer e terá as características masculinas bem desenvolvidas: boa força muscular, agilidade física, orientação espacial e outras coisas que fazem um homem útil a sociedade. Agora não espere que ele lhe declame poesia, entenda seus sentimento ou mesmo consiga completar uma sentença inteligente enquanto dirige. Isto porque as conexões mentais do cérebro feminino são mais eficientes graças ao estrógeno e a melhor integração do cérebro. Neste caso, procure um homem de dedo indicador grande, mas mesmo assim não é garantia. Melhor é não perder as amigas quando estiver namorando...
Caso você procure um parceiro de xadrez desafiador, prefira um homem. A mulher tem a capacidade de efetuar duas ou mais tarefas complexas ao mesmo tempo, os homens só podem se dedicar a uma, por esse motivo eles são mais eficientes jogam xadrez ou num calculo matemático, pois sua atenção estará voltada só para aquilo, mas se houver um terrorista no recinto, a mulher será a primeira a perceber. Por este motivo os homens são mais egoísta, se eles não conseguem se concentrar em mais de uma coisa ao mesmo tempo, como se concentrar no outro? É fisiológico, mas não é desculpa, tudo pode ser treinado. Do mesmo jeito que existem excelentes matemáticas e jogadoras de basquete. Mas a mulher é mais adaptável, razões evolutivas, ela vive mais tempo, cria seus filhos e os filhos de seus filhos, já o homem, quando não pode mais prover alimento e defender seu território, passa a ser descartável para a natureza. A testosterona é sua fonte de combustível e sua sentença de morte. Por isso, os meninos, quando nascem, são mais robustos que as meninas, porem seus sistemas imunológicos são mais fracos e seu desenvolvimento neurológico está 4 semanas atrasado em relação as garotas.
Quanto ao sexo... Isso todo mundo quer saber... Todo mundo acha que sabe... Mas a verdade é que sim, os homens, por razões biológicas, sente maior impulso sexual. Só para se ter idéia, um homem jovem saudável produz cerca de mil espermatozóides a cada batida do seu coração, isso dá um bilhão de espermatozóide para cada óvulo (ah se fosse assim...). Mas a pergunta é, quem aproveita mais o sexo? Surpresa, são as mulheres. Os orgasmos femininos são de melhor qualidade que os masculinos, elas podem ter vários orgasmos num período mais curto e também graças a qualidade de seus processos mentais são mais bem assimilados. Por isso não precisamos de tanto sexo quantos eles, porque temos qualidade!
Homens e mulheres possuem diferentes estratégias para viver, eles atacam a vida de frente, fazem guerra, não são pacientes; elas são atacadas pela vida, estabelecem contato com o mundo, criam vínculos, criam vidas.
Bom, agora que vocês já tem as informações básicas; mulheres não transam como homens, não bebem como homens e nem dirigem como homens e homens não falam como mulheres, não se preocupam como mulheres e se apaixonam a seu próprio modo, que tal deixar os papéis de lado ser sermos nós mesmo só por hoje?




terça-feira, junho 10, 2003

 
About the blog
Vou dar uma trégua nas lendas de Botucatu para falar das lendas deste Blog mesmo. Essa semana chegaram aqui procurando "blog + Giuliana + drogas". Gostaria de saber se essa pessoa ficou feliz com o que viu. O problema do blog é a frustração de não saber porque os seus leitores o procuram. Curiosidade sobre a vida alheia? Um engano? Porque o blog é bem escrito? Tem dicas interessantes? Eu, particularmente, prefiro ter 2 leitores do que 50 "invasores", aquele tipo que entra na sua pagina procurando por termos como "sexo grupal com cadávers", "como encontrar Jesus", "arca de noé para exploração do espaço", alias, este ultimo até gostaria, provavelmente seria um cara muito criativo... De qualquer maneira, um escritor, se vende 5000 livros, dificilmente esta pessoa pagou uma nota e não vai ler ou comprou um livro romance achando que era um livro de culinárias. Alias, tem gente que sabe tanto o que quer ler que lê Paulo Coelho, aquela coisinha básica, sem originalidade, que tem gente que chama de literatura
Outra coisa chata nos blogs é que eu, como boa leitora de literatura, fico conversando com o livro, queria ter o autor na minha frente para descordar, parabenizar ou dar uns tabefes nele. Mas o leitor do blog dicifilmente faz isso, mesmo podendo, o leitor do blog é um navegante, e seu barco nunca para. Matéria da faculdade no ano passado, tudo na internet é hipertexto, dificilmente o leitor vai até o fim da página sem clicar em algo antes, links, links, links, impulsos telefônicos, tempo, tudo é efêmero e essa lenda já estourou seu tempo.
Mas eu voltarei...


domingo, junho 08, 2003

 
Lendas de Botucatu - Perseguidores Implacáveis.
Era uma terça-feira de junho de 1999, excepcionalmente quente para aqueles dias. Acordei cedo e vesti meu traje padrão de zootecnista, que incluía tênis marrom, calça jeans e camiseta branca.
Como marcado, ao nascer do sol, já me encontrava no Lajeado para confrontar meu destino. Subi confiante a escada do ônibus. Professor Nicolau já nos aguardava e seguimos para uma fazenda de eqüinos para cumprir nossa missão.
Sei que assim que pisei no solo da fazenda eles sentiram minha presença. A pastagem se agitava com brisa quente, eles se espalhavam. Eu só via cavalos castanhos, narinas dilatas, terra vermelha... limpei o suor da minha testa com as costas da mão. Seria um longo dia.
O fazendeiro nos explicou a situação: uma fazenda de gado, dois cavalos garanhões, muitas éguas de péssima conformação; cabeças iriam rolar.
Sem saber, eu os atraia em minha direção. Atravessei um campo curto coberto de capim de cerca de um metro e cheguei até o estábulo dos potros, mal sabia eu que tudo começava ali. Subi num tronco e me debrucei nas tábuas que formavam a parede. Conversei com os animais, mas não tinham muito que dizer. O calor ficava cada vez mais insuportável e voltei para o meu bando para avaliar os animais.
Passamos uma hora de pé no meio do mato, duas horas, três...eu podia sentir, passei as mãos pela perna, três milhões, subindo pelas calças, por dentro, por fora, três milhões de micuins, minhas mãos ficaram cobertas de pontos marrons do tamanho da ponta de um alfinete. Eles agarravam a minha pele com unhas e dentes, sugando meu sangue.
Foi uma das lições que a vida me ensinou: entre março e julho, estas criaturas demoníacas, larvas de carrapato, ficam em grande número nas folhas das gramas ou de pequenos arbustos esperando pacientemente sua presa, fazem dela um banquete, submetendo-as a uma coceira infinitamente terrível.
Por uma semana tive que andar de bermuda e chinelo no "fresco" inverno de Botucatu. Lavei minha roupa com todo tipo de veneno existente, daqueles que tem caveirinhas no rotulo. Por dias achei “vampirinhos” na minha pele e no meu lençol. Não dei trégua até que tivesse exterminado todos eles, exceto os do meu sonho. Durante meu primeiro ano na faculdade, quando freqüentava semanalmente o setor de eqüinos, era a imagem deles andando sobre minha pele que me acordava, eu acendia a luz no meio da madrugada vasculhando por sinais de micuins ou gordos carrapatos estrelas.
Pulverizamos o setor de eqüinos também da fazenda Edegardia, testei todos os repelentes disponíveis em mercado, habituei-me a tomar banho com sabonete de enxofre antes de minhas visitas, passei a evitar os arbustos e nossos encontros foram rareando, não voltei a encontra-los desde 2000, mas sei, que em algum canto úmido, eles aguardam, invisíveis e sedentos, por um descuido meu.



sexta-feira, junho 06, 2003

 
Lendas de Botucatu - Caça aos Morcegos

Wilson Uieda é o maior morcególogo da America Latina e foi meu professor na UNESP lá em Botucatu. A Virgínia, esposa dele, também não fica atrás e era chefe da cadeira de zoologia. As tardes de segunda-feira sentávamos nos fundos do departamento de zoologia e aguardávamos no sol pela dupla e sua coleção de bichos empalhados. Eu poderia falar por horas daquelas tardes ou sobre como professores como eles são raros e preciosos. Mas eu escolhi uma aula só, um das aulas mais "inusitadas" da minha vida; poderíamos escolher entre quatro aulas de campo, e eu, claro, escolhi "caçar" morcegos com o seu Uieda.
É óbvio que devido a natureza do sujeito, a aula ocorreria ao anoitecer. A trupe das 9 alunas que escolheram acompanhar o cara estavam animadíssimas e nem se lembraram do fato de que o horário de verão não afetava os morcegos. A seis da tarde já estávamos, como combinado, reunidas na parte mais tranqüila e perto da mata fechada da Fazenda Lajeado.
Quando o professor Uieda chegou, pediu desculpas por ter se esquecido do problema com o "fuso horário" e perguntou se nos importaríamos de ficar até mais tarde. Instalamos 3 finas redes para captura dos morcegos entre as árvores a cerca de 30 metros de onde estávamos e nos sentamos numa clareira esperar escurecer.
Duas horas ouvindo os casos do Uieda, que freqüentou os lugares mais ermos do Brasil e da America latina em busca dos pequenos mamíferos já estava me sentindo a própria aluna do Indiana Jones oriental. Ouvi histórias, aprendi sobre Desmodos rotundo (os vampiros sanguinários!!!) e as lendas mais estranhas a respeito das pequenas criaturas.
A noite caiu escura no lajeado. A cada quarenta minutos íamos até a rede e retirávamos com cuidado os morcegos colocando-os em sacolas para identificação posterior e voltávamos contentes na absoluta escuridão para continuar a conversa na roda.
Já passava das onze quando retiramos as redes e seguimos para o terreiro do café, um local próximo e aberto, onde catalogaríamos os morcegos e os soltaríamos. Fiquei expert em reconhece-los, foram cerca de 30 frugíveros, um comedor de insetos e, para minha tristeza, apenas 3 hematófagos. Os Draculinhas andam em baixa e, apesar de feios que só vendo, são criaturas muito simpáticas, fazem até trancinhas em crinas de cavalos! Distinguimos as fêmeas dos machos, fizemos apalpação das grávidas, discutimos a sexualidades deles e por fim soltamos os danados.
Acho que nunca cheguei tão tarde de uma aula, lá pela meia-noite...
Você estava esperando um final espetacular? Alguma moral?
Bom, foi isso. Foi muito bom, adquiri um certo carinho pelos morcegos. Não sei como eles vão me influenciar na minha vida como psicóloga. Mas essa foi uma história que devia a Virgínia e ao Uieda. A história que eles me deram.




terça-feira, junho 03, 2003

 
Lendas de Botucatu - A estrada para Edegardia.
Era uma manhã quente em Botucatu em algum canto de 1999 quando eu descia a estrada de terra da Fazenda Edegardia. Não consigo localizar precisamente o mês. Aqueles dias se condensam em minha memória quando tento organiza-los. Prefiro deixa-los assim, latentes e dilatados.
A estrada da Edegardia é um lugar meio santificado para mim. Uma espécie de ligação com um mundo onde o tempo não existe, na fazenda cada ser tem seu próprio tempo, a única regra é: verão, estação do calor escaldante, e inverno, estação do calor gostoso. A estrada é uma espécie de abrigo, cercada de uns poucos quilômetros de mata, desenhada com sombras e luzes que se infiltra por entre as arvores, palco de uma das mais belas vista para o vale que se forma a seus pés, a leve bruma de terra que se espalha no ar, o silêncio que impera, o fio d’água que corta a estrada no verão repleto de borboletas que voam por todos os lados ao passar dos carros. Tudo conspirava pela magia do lugar.
Mas é estrada, caminho, passagem, de gente que vai e volta, de gente que passa, de terra batida, de buracos e pedregulhos, é pirambeira.
Só que naquela manhã eu me surpreendi com um habitante da mata, um cervo cruzou meu caminho e parou na frente do meu carro. Olhos arregalados me observavam, orelhas como dois radares na minha direção, o pelo castanho brilhando. Desliguei o carro e debrucei sobre o volante e lá ficamos, os dois parados, trocando olhares, segurando a respiração. Num gesto elegante abaixou a cabeça, como num cumprimento, e atravessou a estrada cedendo passagem. E apesar de só haver dois sentidos para seguir, lá eu senti, a estrada era minha e eu poderia ir para onde eu quisesse ir.



segunda-feira, junho 02, 2003

 
Vertigem:
Que paz é ficar perdurada a 80 metros de altura na beira de uma cachoeira. Escalada, rapel, não importa a direção, na pedra é tudo igual, a pedra é seu horizonte.
A pedra que não morre, se transforma; não tem angustia, tem atrito; não tem sabedoria, tem magnitude. Percorrer a pedra não é desafio, é integrar-se a terra.
É preciso disposição para conhecer a pedra, atenção para anteceder-se a gravidade, paciência para a lenta jornada. Viver a pedra é conhecer sua própria força, conversar com o corpo. De mão queimada pela corda, dedos calejados, joelho sangrando. É o corpo que se adapta a pedra.
A pedra não dá medo, o medo é da idéia, da idéia de se estar vivo, de se estar longe do chão, de não sentir frio, de não sentir calor, de não sentir dor. Que paz é poder abraçar a pedra.




"A vida é como topografia, Haroldo. Há picos de felicidades e sucessos... pequenos campos de chata rotina... e vales de frustrações e fracassos..."
Calvin & Harold


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